segunda-feira, julho 27, 2009

Por que a arte?

Ao passo que aceitamos continuar vivendo numa sociedade que vai de mal a pior, como assim me parece a nossa, mais grandiosas vão se tornando as obras de arte. Triste constatação: a intensidade de uma obra apruma tanto mais o desgosto impera sobre nosso suspirar cotidiano. Se consagramos a desmesura, a obra chega ao limite do que pode ser belo naquilo que é triste, hediondo, insuportável. Arte existe a partir disso, não? Se não, de qual fartura artística se vale uma "Guernica", de Picasso, se a Guerra Civil Espanhola não tivesse acontecido? De qual brilho genial teria aparecido uma Nona Sinfonia se Beethoven (e aí incluo Schiller) não percebesse o drama humano na Europa do século XVIII? De que moleca preciosidade viriam as palavras de Manuel Bandeira se não assumisse a beleza de ser um poeta menor, já que menor é aquele que brinca com as palavras, não o que levanta prédios, ou montantes de dinheiro? Mais uma vez (talvez sempre), vale a máxima de que, para vivermos uma vida sem justificativa alguma, só uma vida com arte.
Janet Cardiff e Thomas Tallis me fizeram suspirar o dia com um aroma doce de esperança e luta, de leveza e serenidade. Que acalanto o sopro das vozes que cantam "Spem in Alium nunquam habui"! Convido aos interessados a não cruzarem os braços frente ao desgostoso imperativo que só torna nossa condição cada vez mais desumana e a ouvirem/auscultarem a ternura desta composição do século XVI. - Só para fazer valer, mais uma vez (talvez sempre), a máxima de que precisamos de uma vida com arte.
Foto: Janet Cardiff, Forty Part Motet, 2001.

2 comentários:

Nanda disse...

ouvir as vozes ecoando de todos os cantos foi uma experência de dar arrepios! beijo!

AS RUSSAS disse...

Estive nessa galeria já umas três vezes, todas as vezes que fui ao Inhotim. Uma experiência sublime!
Sempre me impressiono.
beijinho.