terça-feira, setembro 05, 2006

Só deixe...


Nunca imaginei que um dia pudesse ser assim. Enquanto escrevia, estava distante da escrivaninha - a cadeira em que estava encostado não me deixava chegar perto. A caneta estava estranhamente pesada... ela vibrava em minha mão... esquentava... (ou era minha mão que estava ansiosa?) Diante de mim estava a sua carta... e meus olhos fixaram-se - eles não conseguem desviar - numa de suas palavras. Vagarosamente, o absurdo ia controlando tudo... já não sei mais. "Há algo de obsceno e libidinoso na própria forma das letras", diria Joyce. Irresistível e diabólico. O que é esse movimento que me faz ficar sentado quase imóvel, como se fosse aparecer a coisa mais fantástica que poderia fazer? O que é isso? Vagarosa e asperamente rasgando. Sempre. É ou não é assim? Ficar em cima e lutando para sair da caneta o possível de se escrever, ainda que impossível... Não vejo outro verbo senão espremer...
Descobri, é verdade, sou um ladrão... Para que o roubo seja sagrado, não é você que tem que falar, deixe o desastre falar em você...
Pintura de Matisse.

2 comentários:

Anônimo disse...

deixar o desastre falar...

Anônimo disse...

Somos ladrões.
E adoro Matisse.

E saudade de falar com você.